O ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga defendeu que o Brasil repense as prioridades do gasto público, com ênfase em saúde, e que o País precisa enfrentar discussões sobre incentivos "perversos" que beneficiam os mais ricos, incluindo deduções de Imposto de Renda e renúncias fiscais como a Zona Franca de Manaus.
Ele participa de painel para discutir os desafios e oportunidades na saúde pública na Brazil Conference, evento anual realizado pela comunidade brasileira de estudantes na região de Boston que ocorre neste sábado, 12.
Fraga mencionou que, nos últimos 30 ou 40 anos, o gasto público primário passou de 25% do PIB para 33%, ao passo que o investimento público, sem contar estatais, caiu de 5% para 1% do PIB.
"Isso é um sinal de que nós temos que repensar as prioridades do gasto público. Quando a gente olha o SUS, com os dados que eu acabei de mostrar, o SUS gasta 4% do PIB. É um assunto que a gente tem que discutir na arena política", disse. Ele já havia mencionado que o sistema de saúde público inglês, que tem um gasto per capta em média seis vezes maior que o brasileiro, vem enfrentando dificuldades.
O economista ponderou sobre o papel do Estado brasileiro, que não consegue atender essa demanda da saúde pública, e que precisa enfrentar discussões sobre "incentivos que são perversos". "De incentivo perverso, o sistema brasileiro é um sistema no qual os subsídios vão para os mais ricos. Exatamente isso que eu estou falando. Nós estamos falando aqui de deduções de Imposto de Renda, tanto na pessoa física quanto na pessoa jurídica, e muito mais", mencionou.
Questionado sobre como melhorar as formas de financiamento no SUS, Fraga ponderou que é possível ter ganhos melhorando a gestão do sistema e adotando novas tecnologias, mas destacou que há um problema de prioridade no Orçamento. Ele disse que o dinheiro está em três grandes blocos, sendo que um dos mais relevantes é o de gastos tributários.
"Estou falando disso, de vários tipos de subsídios que vão da Zona Franca de Manaus até os sistemas especiais de Imposto de Renda para quem acompanha o Simples, o Lucro Presumido, que, em última instância, são imensos subsídios para os mais ricos", disse.
Fraga disse, ainda, que a taxa de impostos paga pelas pessoas mais ricas é baixa, e citou como exemplo um advogado que tenha faturamento anual no teto do Simples, que é de R$ 4,8 milhões, e que vai pagar imposto de 5% sobre a receita. Para ele, a taxa de imposto para essas pessoas pode ficar em torno de 10%.
"Alguma coisa está entrando em discussão tardiamente, mas, enfim, antes tarde do que nunca", disse, em alusão à proposta de reforma da renda enviada pelo governo Lula, que amplia a isenção do IR para quem recebe até R$ 5 mil com contrapartida na tributação de rendas mais altas.
Fraga também mencionou a questão demográfica, com o envelhecimento da população pressionando a Previdência e a necessidade de uma nova reforma desse sistema. "Acho que dar uma pensada sobre isso, não só pode ajudar ou melhorar, aumentar a produtividade do Estado no Brasil, como, eventualmente, no horizonte de alguns anos, também contribuir para ter mais recursos. Isso tem que passar a bola, então, para o Congresso, que tem que incorporar isso nas suas prioridades. Esse é o jogo", disse.